segunda-feira, 24 de abril de 2017

Conheça os artistas que brincam com as regras da fotografia documental

abril 24, 2017 | por Ligia

Em artigo para a LightBox, seção de fotografia da revista time, Laurence Butet-Roch apresenta uma série de trabalhos artísticos que desafiam as noções de veracidade e subjetividade dentro do fotojornalismo.

Empoleirado em um ponto de observação que lhe ofereça uma visão abrangente do parquinho, o fotógrafo James Mollison aguarda pelo sinal da escola. Assim que as crianças chegam correndo para fora ele tira fotografias e mais fotografias capturando o fluxo de suas brincadeiras. Enquanto faz isso, pensa sobre sua própria infância e em como o momento do recreio ajudou a moldar seu caráter. “Nenhuma foto única seria capaz de transmitir a complexidade de emoções e experiências que se tem num pátio de escola”, conta ele. “Eu queria criar imagens sedutoras e em camadas, então fui obrigado a combinar partes retiradas das imagens fotografadas durante o recreio, escolhendo quais incidentes ou expressões eu incluiria.”

Ele denomina os quadros resultantes de “still time-lapses”. “Pode não ser a fotografia documental em essência, mas é fiel. Todas estas interações aconteceram, no entanto nem todas de uma vez. É o tempo encapsulado em um quadro,” acrescenta o fotógrafo britânico.

Em uma época na qual o campo do fotojornalismo luta para se recuperar das controvérsias relacionadas à manipulação antes, durante e após as fotos serem tiradas, fotógrafos como Mollison que busca a partir de suas combinações uma forma de falar sobre o mundo ao seu redor, desafiam ainda mais as noções de veracidade e subjetividade dentro do fotojornalismo.

“O momento decisivo é um conceito importante, no entanto não experimentamos o mundo desta maneira”, diz o fotógrafo Sean J. Sprague. A vida é uma montagem de acontecimento que se reúnem ao longo do tempo. Ao passar várias horas fotografando uma mesma cena e mesclando elementos de cada foto em um quadro único, crio de algum modo, uma representação mais verdadeira deste espaço, pois não estou captando apenas um momento isolado. Depois de uma primeira viagem para documentar o funcionamento interno de uma fazenda industrial em 2010, com resultados bastante insatisfatórios, o homem de 33 anos decidiu passar vários dias fotografando milhares de close-ups. Após meses de edição, considerando cuidadosamente onde cada pessoa (e porco) deveria ser posicionada, obteve como resultado impressões fantásticas e extremamente detalhadas que de fato transmitiram a sensação de um empreendimento tão grande.

“Há muitas maneiras de se dizer uma verdade e algumas vezes isto pode estar relacionado com acontecimentos sucessivos” esta é uma reflexão de Julie Blackmon, que tem seu trabalho centrado em seus filhos. A artista americana vem de uma família de nove irmãos e agora cria seus três filhos. Ela diz que prefere os trabalhos com técnicas compostas por que elas tem a capacidade e a liberdade de traduzir visualmente suas reflexões sobre o significado da vida em família no novo milênio. “Não quero estar restringida às regras que estipulam como uma imagem deve ser tirada para contar às histórias que me importam”, diz ela. Pode-se esperar pelo momento ideal – enquanto alguém empurra uma cadeira vermelha para baixo de uma rampa de carregamento na frente de seis crianças curiosas, enquanto uma delas brinca com plástico bolha – para que ele aconteça ou que seja composto.

“Uma vez que você se torna ciente das possibilidades, é difícil voltar atrás”, diz o fotógrafo Scott MacFarland. “Eu não sentia que era muito bom com a fotografia tradicional. Quando comecei a olhar minhas folhas de contato, pensei: “Caramba, queria que esta pessoa à esquerda olhando à distância estivesse no mesmo quadro que a pessoa da direita olhando para ela, ou gostaria que a luz fosse aquela da manhã. ’”

Desde então o fotógrafo tem utilizado técnicas compostas para representar os diversos elementos da vida contemporânea canadense, desde o tempo que os soldados passam no exterior até repatriação daqueles que foram abatidos no Afeganistão. Seu último trabalho, uma série produzida em 2010 ele utilizou-se de um conjunto de diretrizes mais rígidas que ele relaciona aquelas que dominam o fotojornalismo. Ele evitou interferir com a cena tal qual ela acontecia tampouco interagia com as pessoas nela. “Eu fotografei apenas o que testemunhei, da forma como aconteceu. Embora o resultado final raramente pudesse ser aproveitado no tribunal de justiça, ele é representativo do que ocorreu em cada um destes dias. A única diferença para uma abordagem de fotojornalismo é que em meu estúdio eu passei incontáveis horas combinando várias fotos diferentes em apenas um quadro”, observa o fotógrafo.

Embora seja necessário certo esforço para ter certeza se as imagens destes fotógrafos sejam naturais e não construídas, nenhum deles tenta enganar o público sobre o seu processo. “Não importa o que fazemos, as pessoas podem dizer que são montagens”, afirma Molison. O que acontece é que há uma muitos momentos decisivos em uma mesma composição para que ela possa ser de fato real.”






















Laurence Butet-Roch é um escritor freelance, editor de fotos e fotógrafo baseado em Toronto no Canadá. É membro do Boreal Collective.