Enseada de Botafogo, Rio de Janeiro (IMS) |
Uma das grandes curiosidades despertadas em quem observa fotografias antigas é saber onde exatamente fica aquele local. Um grande desafio imposto a pesquisadores para conseguir traçar a cidade dos dias de hoje sobre os registros do passado, levando-se em consideração as mudanças urbanísticas que ocorrem ao longo das décadas. Mas, com a ajuda de um software suíço de georreferenciamento, esse problema começa a ser solucionado.
Com a tecnologia, chamada de ferramenta de monoplotagem (monoplotting tool), o Instituto Moreira Salles (IMS), que reúne cerca de 800 mil imagens em seu acervo, já transpôs com precisão para uma foto da Enseada de Botafogo, tirada por Augusto Malta em 1910, o mapa atual do lugar. A partir de marcos geográficos, como o Pão de Açúcar, foi traçada na fotografia onde ficaria mais tarde a linha do aterro.
O software utiliza como base pontos de referência geográficos tanto no mapa quanto na fotografia e, a partir daí, realiza cálculos matemáticos e ópticos para encontrar a posição da câmera e transformar fotos em mapa. Aplicada na Suíça em pesquisas sobre alterações no meio ambiente, a ferramenta permite reconstruir a paisagem e entender a sua dinâmica com o uso de fotos históricas. O processo foi desenvolvido pelo Instituto Federal Suíço de Pesquisa de Florestas, Neve e Paisagem (WSL).
"É como se as fotografias fossem mapas do passado. É o reconhecimento da foto como fonte de informação histórica", explica o curador de fotografia do Moreira Salles, Sergio Burgi, em matéria do jornal O Globo. Ele acrescenta que as tecnologias de georreferenciamento já fazem parte do dia a dia. "Ferramentas digitais de orientação do espaço urbano como Google Earth e Waze estão se tornando cada vez mais parte do nosso cotidiano. Ao mesmo tempo, fotos são um documento do espaço urbano, que, no Brasil, é marcado por muita transformação, diferentemente do que ocorre na Europa. A fotografia no nosso país acompanha essas mudanças e ajuda a entender as transformações históricas."
Praça da República, Rio de Janeiro (IMS) |
O Moreira Salles já começa a processar com o sistema suíço uma gama de fotos do Rio, do período entre 1860 a 1920, momento em que a cidade se expandia para a Zona Sul. Elas abrangem uma faixa que vai de Botafogo até o Morro da Providência, incluindo o Centro e a Zona Portuária. Lugares da cidade que não existem mais também serão remapeados com as linhas atuais, como o Morro do Castelo e o Morro de Santo Antônio.
Imagens do suíço Georges Leuzinger (1813-1892), um dos primeiros fotógrafos a registrar vistas do Rio e de Niterói, no século XIX; do franco-brasileiro Marc Ferrez, maior nome da fotografia brasileira no século XIX; e de Augusto Malta (1864-1957), principal fotógrafo da evolução urbana da cidade nas primeiras décadas do século XX, farão parte dos estudos.
Comparações impactantes
Com esse sistema, que também utiliza imagens de satélite, o instituto chegou ao panorama atual da cidade a partir do mesmo ponto fotografado por Leuzinger em 1865, numa imagem que tem como referência o prédio do Arquivo Nacional e mostra os arredores do Campo de Santana. A comparação é impactante: construções baixas e boa parte da vegetação deram lugar a um mar de concreto e espigões. Foi feito o mesmo com uma foto de Marc Ferrez de 1890, do antigo Quartel Central do Corpo de Bombeiros: na rua, charretes e imponentes casarões. O mesmo ponto de vista em 2016 revela a decadência do casario, que sobrou à beira das antigas pistas.
Fonte: O Globo