sexta-feira, 20 de janeiro de 2023

Fotografia de Lula com vidro quebrado gera debate na internet

janeiro 20, 2023 | por Resumo Fotográfico



A fotografia do presidente Luiz Inácio Lula da Silva que estampou a capa da edição impressa do jornal Folha de S.Paulo de quinta-feira (19) gerou um intenso debate nas redes sociais. Na imagem, Lula aparece de cabeça baixa, sorrindo e ajeitando a gravata, atrás de um vidro trincado. Trata-se de uma fotografia tirada usando a técnica de múltipla exposição, com a imagem de uma das vidraças quebradas durante os ataques em Brasília, no dia 8 de janeiro.

A dupla ou múltipla exposição é uma técnica fotográfica na qual o mesmo fotograma é exposto duas ou mais vezes. Essa sobreposição de imagens é feita na própria câmera, sem na necessidade de um software de edição. A combinação das duas imagens capturadas gera uma terceira fotografia, em que o conteúdo sobreposto ganha um novo significado. Nesse caso, a foto de Lula ajeitando a gravata se juntou com outra do vidro do Palácio do Planalto trincado.

A imagem gerou uma intensa discussão nas redes sociais, tanto sobre o sentido e contexto da composição da imagem quanto sobre a técnica utilizada no fotojornalismo. “Um eufemismo, em tempos de pós-verdade, para definir a manipulação da informação. Isso não é jornalismo. Isso é uma perversa adulteração da realidade”, escreveu Lira Neto em sua conta no Twitter, referindo-se a técnica de múltipla exposição, como está descrita na legenda da foto no jornal.

Já o quadrinista e ilustrador Orlandeli fez uma interpretação diferente: “Na minha leitura mostra bem o cenário. Alguém visado, sendo alvo, querem derrubar… mas, continua lá. A expressão tranquila, ajeitando a gravata… passa até um ar de maturidade diante de todo esse ruído. Conhece o jogo. Uma imagem cheia de contrastes”, escreveu o artista em seu Twitter.



A Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República divulgou uma nota repudiando o uso da fotografia: “É lamentável que o jornal Folha de S.Paulo tenha produzido e veiculado uma imagem não jornalística sugerindo violência contra o presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, no contexto dos atos antidemocráticos de 8 de janeiro. Trata-se de uma montagem, por não retratar nenhum momento que tenha acontecido”, diz o texto do governo.

A Associação Brasileira de Imprensa divulgou uma nota, intitulada “Fotomontagem na capa da Folha é um atentado ao jornalismo”. O texto afirma que a fotógrafa usou da tecnologia para “produzir uma realidade criada a partir de uma foto que escapa ao princípio da captura do instante, compromisso consagrado no exercício da profissão que tem a responsabilidade de informar a sociedade com o registro imagético dos acontecimentos como de fato se dão”.

Diante da repercussão, a fotojornalista Gabriela Biló, autora da imagem, se pronunciou sobre o assunto em seu perfil no Twitter. “Tem quem veja morte, tem quem veja resistência, só um trincado, tem quem veja um sorriso atrás […] não vou dizer o que você tem que ver”, disse Biló. “Fotojornalismo não é feito para agradar”, completou. “Essa só é a forma como eu vejo o mundo. Você pode ter o seu olhar, discordar do meu, tudo bem, o mundo é plural.”

Em publicação para a coluna Folha por Folha, a fotógrafa detalhou como a imagem foi feita e se posicionou em relação ao conceito é técnica utilizada. “Apontei a câmera para os trincos do Palácio e depois para o presidente que estava no andar de baixo. Esperei. Esperei por uma expressão que simbolizasse aquilo que eu estava lendo: o Palácio resiste.”

“A foto única trouxe sentimentos ambíguos e leituras diferentes; a meu ver, todos válidos. Há quem veja um presidente derrotado e morto, vítima da violência, há quem veja um poder inabalável, reconstrução, blindagem, resistência, entre muitas outras interpretações.”

“Como autora da foto, não vou dizer o que as pessoas têm que sentir, respeito como a foto chegou a quem viu violência. Mas a verdade não é uma só. Como a autora da foto, aceito as críticas. Ninguém é obrigado a ver o mundo da mesma forma que eu.”