segunda-feira, 26 de outubro de 2020

ODÙ e o legado negro da Feira de São Joaquim no fotolivro de Hugo Martins

outubro 26, 2020 | por Camila Camargo

Designer gráfico e fotógrafo, Hugo reúne em formato de fotolivro o resultado de uma pesquisa visual em um dos locais mais simbólicos de Salvador, a Feira de São Joaquim

Imagem de divulgação do fotolivro, via Catarse

Nascido em São Bernardo do Campo, município de São Paulo, Hugo é filho de pai negro e mãe branca. O pai saiu de Minas Gerais para viver em São Paulo e a mãe do interior para o município. Hugo por sua vez, em 2002 mudou-se para Salvador. 

Além de uma particularidade de Hugo, a migração surge como um tema quase espontâneo na vida de brasileiros. A diferença, está nos arquivos de memória, nos caminhos que conseguimos ou não enxergar, inclusive por meio da fotografia. Isso, Hugo logo percebeu durante uma pesquisa sobre a sua própria família. No trabalho "Memórias de Memória", de 2015, investigou a origem de suas raízes por parte de pai. Porém, muitas lacunas permaneceram abertas. Assim, como permanecem nas histórias de muitos negros brasileiros.

O apagamento histórico e institucionalizado da memória negra, se impõe como barreira ao seu legado. Mas em ODÙ, que em yorubá significa destino, o trabalho do fotógrafo encontra o seu caminho e consegue construir no presente uma conexão com o seu passado enquanto homem negro.

O cenário é a Feira de São Joaquim. Ela herdou espaço da antiga Feira de Água de Meninos, extinta em 1964, destruída por um incêndio. Hoje, é um dos locais mais tradicionais da cidade e de suma importância para o comércio local, distribuindo desde alimentos a artigos religiosos de matriz africana. A Feira é símbolo da resistência e da cultura negra. 

Foto de Hugo Martins, via Catarse

A ideia de construir um fotolivro vem da necessidade de apresentar o trabalho de maneira acessível não só aos interessados por fotografia, como também de pessoas interessadas nas discussões sobre a diáspora negra e cultura afro. Se não há garantias quanto ao preenchimento das lacunas do passado, ao menos no futuro teremos esses belíssimos registros. 

Ao todo são 54 imagens. Ao fugir do olhar exótico, Hugo nos convida a descolonizar o olhar, que por anos e anos ora esconde ora hiperssexualiza os corpos negros. Aqui, o foco sequer está nos rostos e corpos, está no comum, no retrato do cotidiano dos tantos trabalhadores que com dignidade vivem e sobrevivem por meio da Feira. 

O projeto está aberto para apoiadores no Catarse.