sexta-feira, 9 de abril de 2021

Exposição traz reflexões sobre encontro do mangue e a cidade de Recife

abril 09, 2021 | por Resumo Fotográfico


Estreia nesta sexta-feira (9), a exposição virtual “Lapsos, Aterros e Memórias”, do fotógrafo Marcelo Soares, que apresenta reflexões sobre o encontro do mangue com a urbe na Zona Sul de Recife. As fotos e vídeos são frutos de um olhar às transformações da vida urbana naquela parte da cidade, com seus impactos ambientais, e também afetivo, permeado pelas memórias de uma infância vivida naquela região em meados da década de 1970.

A região fotografada por Marcelo abriga o maior manguezal urbano do país, a Unidade de Conservação da Natureza (UCN) Parque dos Manguezais (320 ha), e uma das maiores e mais caras obras viárias da cidade do Recife dos últimos 30 anos, a Via Mangue (R$ 431 milhões).

“Ao fazer esta imersão imagética e sonora pelo ponto de vista do caráter urbanístico e ambiental dos reordenamentos urbanos na região, já que estamos falando de uma área de mata dentro da cidade, peguei emprestado minhas memórias e vivências e as ressignifiquei em territórios circunvizinhos”, explica o fotógrafo, que detalha: “Espaços de convivência dentro da via expressa antes de ser inaugurada e imagens captadas em um espaço público, porém restrito, que ficou ‘preservado’ da especulação imobiliária integram esta relação entre memória, afeto e transformação dentro da exposição. Imagens e sons convidam os sentidos a vivenciar a identidade de manguezal que carrega a urbe.”

Marcelo mora em Boa Viagem desde 1976. “Assisti à mudança drástica que o bairro passou. Tinha 4 anos de idade quando cheguei para morar naquela rua repleta de terrenos baldios, árvores frutíferas e lotes sobre restinga aterrada”, lembra o fotógrafo.

Ele recorda que, mesmo com aterros, havia áreas de restinga e mangue onde o fotógrafo pegava caranguejos e peixes-beta. Terrenos como o “campinho do Zé Peruca” eram espaços de convivência. “Dezenas de campos de futebol a perder de vista em meio ao alagado. Times uniformizados que vinham de diversas comunidades da cidade para participar de campeonatos. Conjunto de mocambos na beira do mangue ou esparsos em alguns destes lotes, com levas de populações pretas migrantes de outras partes da cidade ou do interior do Estado, oriundas de períodos de seca e fome. Mocambos, estes, tão imortalizados em poemas de João Cabral de Melo Neto ou pelos tratados sociológicos de Josué de Castro”, descreve Marcelo.



A exposição

Marcelo Soares organizou a narrativa da exposição em cinco salas virtuais: Lapsos, Muros, Aterros, Memórias e Além-muros. Em cada uma delas, o visitante encontra fotografias e vídeos com paisagens sonoras. No caso das fotos, o espectador pode escolher se apreciará as imagens e sons em conjunto ou de maneira separada, criando imagens a partir de suas próprias referências. A seguir, o fotógrafo comenta sobre elementos que norteiam a organização das obras:
“Lapsos, é o lugar das falhas, dos erros, das intercorrências dos tempos. Da hegemonia de uma solução rodoviária sobre os outros modais de locomoção. Do isolamento de comunidades do resto da cidade. Muros aborda o caráter do reordenamento urbano. Da retirada de espaços de lazer de comunidades preservadas a duras penas. Em Aterros, as sonoridades do território se mostram presentes. Os referenciais são revistos. A visão de dentro do território evidencia os impactos. É ali onde os dejetos e as águas pluviais escorrem até chegar à Bacia do Pina. Memórias faz submergir aquilo que foi aterrado não só em termos físicos, mas também de um modo de viver que já não mais existe no bairro. Das brincadeiras de criança sobre os manguezais, das garrafas com peixes-betas com suas cores verde-anil e vermelho, das brincadeiras com bonecos na beira do mangue que, por um descuido, acabaram seguindo o leito do rio. Dos esconde-escondes de quarteirões. Além-muros é o conjunto de imagens e sons que o citadino dentro do carro não consegue imaginar que existam. Que os muros da cidade impedem a população de ver, conhecer, entender, estudar e se relacionar.”
A exposição fotográfica virtual “Lapsos, Aterros e Memórias”, de Marcelo Soares pode ser vista a partir desta sexta-feira, 9 de abril de 2021, pelo site www.lapsosaterrosememorias.com.br